O Canteiro Revivalista do Dianteiro

Todo o trabalho de cantaria da Igreja de N.ª S.ª da Lapa do Dianteiro é de autoria do canteiro revivalista José Barata.
José Barata nasceu em 1860, por volta de 1880 ingressa na Escola Livre das artes do Desenho encabeçada pelo mestre António Augusto Gonçalves.
Hoje em dia é denominado de artista Coimbrão dos finais do séc.XIX, e princípios do séc.XX. De notável carreira profissional e de reconhecido mérito pelas suas prestações em algumas obras emblemáticas. O Palace Buçaco, onde foi primordial as suas prestações nos ornatos neo-manuelinos, em conjunto com Anacleto Garcia e lhes foi dedicado: “os artistas que passaram á pedra o projecto de Luigi Manini , souberam recriar, com a mesma espontaniedade com que fariam os canteiros-decoradores manuelinos”. (1) José Barata foi uma influência primordial para o Mestre João Machado no estilo neo-manuelino quando trabalharam juntos no Palace do Buçaco (2). Posteriormente á construção do Palace vai para Lisboa, onde o seu nome fica ligado ao trabalho da pedra de diversas obras, como o jazigo dos Benfeitores da Misericórdia, e sobretudo o palácio da Quinta da Regaleira do “Carvalho dos Milhões”, obra a cargo de João Machado.
Com uma carreira repleta de elogios o seu nome está ligado de uma forma modesta a grandes obras revivalistas Portuguesas do início do séc.XX. A pia baptismal da igreja de Santo António dos Olivais projectada e construída somente por José Barata na sua oficina do Dianteiro (obra neo-manuelina de reconhecido valor artístico) é a última obra do artista obra que identifica o prestígio do seu trabalho. “Inacabada” afirmava misteriosamente o artista pouco tempo antes de morrer em 1930, como se possível fosse detectar algum risco na pedra por cinzelar.

A obra do canteiro revivalista José Barata é referenciada em diversos livros e jornais da época em:

“Coimbra e Região”(1) de Nelson Borges
“Um artista de Coimbra”(2) de Pedro Dias
“O Neo-Manuelino” do IPPAR
“Tribuna Popular”
“A Voz do Artista”
“Correio de Coimbra”

O Dianteiro

A origem do topónimo Dianteiro, está relacionado com a da Serra situada adiante da Serra do Buçaco. Apesar desta definição,a lenda que relata o surgimento desta povoação é muito mais romântica. Falavasse que o Dianteiro, era o primeiro ponto de descanso e de refresca para quem fazia o percurso do Mosteiro de Santa Maria de Celas para o Mosteiro de Santa Maria do Lorvão via Serra. Neste planalto, a meio do percurso, os viajantes descansavam e podiam refrescar-se e saciar a sede dos seus animais nas diversas fontes que aqui existiam.

Saber uma data exacta da ocupação deste terriotório é-nos difícil, contudo nos assentos de baptismo de 1606, encontra-se registada uma criança natural do Dianteiro, cujos pais são naturais também desta povoação.

O Dianteiro, situa-se a nordeste de Coimbra, entre a Cova de Ouro e a Carapinheira da Serra. Pertence às freguesias de São Paulo de Frades e Torres do Mondego. A sua altitude é de cerca de 300 metros e encontra-se ao KM 10 da Estrada Municipal nº536.

A Padroeira - N.ª S.ª da Lapa



Nª Sª da Lapa do Dianteiro, as preces e os louvores feitas à virgem poderiam compor um bom documento escrito da importância que Ela tem tido para as pessoas destas terras.
O culto à Nª Sª no Dianteiro começou no início do século, talvez dada à beleza da imagem, com uma pequena procição. Rapidamente se torna padroeira no coração das gentes do Dianteiro. A Ela se dedicam muitos milagres, foi nas horas difíceis das doenças , das guerras, e das aflições que se rogou auxílio entre rezas e orações. Quantas mulheres privaram dos seus cordões de ouro, brincos, anéis, medalhas e outras peças de muito valor para agradecerem à virgem pela sua presença e auxílio nos momentos difíceis das suas famílias. Muitos se desdobram em promessas que se cumprem ao longo do ano, ou em Setembro no Domingo em que NªSª exposta num andor á força de seis homens é levada às ruas do Dianteiro. No dia da Festa a Igreja enche-se de flores e de interessantes trabalhos com colchas de seda e rendas que decoram as paredes. Pelas ruas a procissão faz expantosos conjuntos pictóricos, do guião e das opas vermelhas, ao colorido das bandeiras, dos anjos ao som da banda, mas o silêncio das orações imperam no rosto de muitos.
À Senhora da Lapa gratos, recorremos, é o continuar da nossa cultura transmitida pela nossa gente, que se entranha na nossa alma e torna a Sª da Lapa a nossa fiel representação da Virgem Maria.

Descrição das Cantarias Interiores




O arco cruzeiro faz a separação entre a nave da igreja e a capela-mor, é neste núcleo de transição que o canteiro tomou mais aproveitamento com as suas obras, além do trabalho fundamentado do arco, aliou ao conjunto dois altares laterais encimados por baldaquinos. Posicionando-se no altar esquerdo uma mísula para suportar a imagem do Menino Jesus.

O arco cruzeiro, com sensívelmente 4.5m de altura é ricamente trabalhado, com significados estilísticos interessantes. Os pilares trabalhados entre cordas e flores são encimados por uma cabeça de anjo de cada lado, que delimitam a parte terrena, enquanto o arco faz parte da área espiritual.
Do chão até aos anjos se alteram entre si as flores e as cordas. Depois dos anjos os motivos vegetais aumentam, flores são mais trabalhadas, folhas entrelaçam-se e retrocem-se entre si como se envolvesse todo o fecho do arco. O arco é fechado com vegetação, é o ponto mais alto figurado da nave e sobre o fecho do arco campeia uma vieira como símbolo do batismo e da morte, o princípio e o fim.

Os baldaquinos semi-circulares são definidos por ramagens em sentidos ascendentes e descendentes. Os baldaquinos tem motivos iguais e semelhantes ao do púlpito que acreditam a unidade entre eles.

A mísula de suporte do Menino Jesus recorre aos mesmos elementos utilizados nos baldaquinos e no púlpito. É composto por um conjunto de ramagens que se entrelaçam e formam a base de suporte.

Os altares laterais são mais discretos. Assentam sobre mesa do tipo “ de urna” em pedra, onde se encontra simplesmente esculpida uma cruz. A simplicidade deste conjunto deve-se a estes altares estarem habitualmente tapados com toalhas.

No corpo da nave sobressai do lado esquerdo o púlpito, completamente construído em pedra. Ricamente trabalhado com motivos florais e geométricos, simétricos entre si. A base que sustenta o púlpito é uma alcachofra invertida. Trabalhado com vegetações sobretudo folhas que se retorcem entre si, surge o parapeito que na parte central comporta uma roseta, com um arranjo floral, onde as folhas transmitem movimento, comprimindo ao centro uma flor, este reclínio de movimentos faz com que a própria flor desabroche.

A pia da benção colocada no lado esquerdo da porta de entrada fazia conjunto com outra desaparecida no lado esquerdo da porta lateral.
Semelhante a todas as descrições anteriores, a vieira é suportada por um conjunto de folhagens que se invertem entre si e suportam a pia. Os elementos decorativos desta pia são iguais aos da mísula e do púlpito.

Na capela-mor com a substituição do antigo retábulo com altar incorporado pelo retábulo actual, sem altar, houve a necessidade da construção de um altar de raíz. Esse altar em pedra lavrada , talvez fosse a peça em cantaria mais trabalhada no templo devido ás funções que cumpria, e ser uma peça do fim de carreira do canteiro, que com mais experiência e sabedoria se empenhou em acabar a sua obra. Com o consílio vaticano II a disposição dos altares foi alterada, e esta interessante peça foi destruída sem deixar registos.

Retábulo Barroco


A 21 de Março de 1908 o provedor da Santa Casa da Misericórdia de Coimbra abre a sessão extraordinária com as propostas de compra da antiga talha da capela da Calçada (situada na actual Rua Visconde da Luz construída por cima da nave central da igreja de S.Tiago) que viria por aquela altura ser destruída. Presentes e únicas propostas verificam-se uma dos habitantes do Dianteiro que ofereciam setenta mil reis por um dos retábulos laterais e oitenta e cinco pelo retábulo do altar-mor, e uma proposta da igreja do Senhor da Serra. Em vista a proposta não ser de todo desfavorável e haver a necessidade urgente de retirar a talha, a mesa resolveu abjudicar a talha do altar mor aos habitantes do Dianteiro e os altares laterais ao Templo do Senhor da Serra.

Retábulo da Capela-Mor


Este retábulo da capela-mor é o móvel de maior qualidade artística desta igreja, de estilo barroco do séc. XVIII.
Em 26 de novembro de 1734 a Santa Casa da Misericórdia de Coimbra encomenda este retábulo ao entalhador Portuense José Correia , de madeira entalhada, e ricamente dourada sem qualquer tipo de cromatismo. Ladeado por quatro grandes colunas do tipo salomónicas com capiteis coríntios (duas de cada lado) decoradas com flores, assentes sobre anjos que transmitem pelos seus corpos esforço e sacrifício e encimadas em cada lado por um anjo, que dificilmente são vistos dada a grande aproximação do retábulo ao arco cruzeiro. O trono com sete patamares ricamente trabalhados todos eles diferentes entre si, com motivos contracurvados, concheados e palmas. Assentado no último patamar uma imagem pequena da padroeira sem valor artístico significativo.
O sacrário que assenta na base do trono, apesar de não ser uma peça original deste retábulo não está de tal modo desenquadrado do conjunto. O sacrário do séc.XIX também de madeira entalhada, dourado e policromado, com efeitos de marmoreado, por certo pertencente ao primeiro altar da igreja, que foi substituído em 1908 para dar lugar ao actual retábulo. Esse pequeno altar com três nichos onde estava colocado uma imagem da virgem, de Santo António e S. Mateus, foi colocado na sacristia e posteriormente vendido.
O retábulo actual por não trazer incorporado o altar, José Barata elaborou um altar em pedra lavrada, destruído após o Consílio Vaticano II devido á falta de espaço para o novo posicionamento do altar.

Descrição Interior do Templo


O Templo é composta por dois corpos, nave e capela-mor, separadas por um arco cruzeiro.

No corpo da nave sobressai do lado esquerdo o púlpito em pedra lavrada, ao lado uma tela da Anunciação do Anjo à Virgem dos finais do séc.XVII. Nos flancos do arco cruzeiro estão colocados dois altares, sendo o da direita o de Santo António, e o do lado esquerdo dedicado à Sagrada Família, sendo a virgem Maria representada pela imagem de Nª.Sª. da Lapa, padroeira desta igreja.
Os altares laterais não apresentam qualquer retábulo, a sua simplicidade evidência a qualidade artística dos baldaquinos em pedra que encabeçam os altares que assentam sobre mesa do tipo “ de urna” em pedra onde se encontra simplesmente esculpida uma cruz. No altar da sagrada família uma mísula de pedra ao centro sustenta a imagem do Menino Jesus.
Junto ao altar de Santo António há um lampadário com um suporte de ferro forjado da autoria de Daniel Rodrigues, com motivos florais estilizados, dos finais do século XIX.
Ao fundo dois nichos (que são as janelas) que ladeiam a porta encontram-se as imagens de S.Mateus no lado direito, e no lado esquerdo de NªSª de Fátima junto á pia batismal.
Ao lado esquerdo das portas as pias de água benta recebem os crentes.